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Muito além do nariz vermelho


Risadas e lágrimas. Pode ser difícil conseguir relacionar ideias tão opostas, mas para Maria José Macedo, também conhecida dentro dos hospitais como Dra. Jertrudes ou simplesmente como Jô, é possível arrancar sorrisos mesmo em um ambiente tão complicado.

A pernambucana, de cabelos avermelhados e sorriso largo, possui 62 anos de muita experiência nesse campo. Jô afirma que “Levar um pouco de amor e carinho, ou mesmo somente um pouquinho de escuta atenta”, é o que caracteriza os palhaços humanizadores — gente que quer proporcionar suspiros de alívio em meio ao sofrimento e aos temores de um hospital.



Foto: Treinamento de novos voluntários, 2018


A Cia Anjos da Alegria possui 125 associados que visitam mensalmente em quatro hospitais em Sorocaba: o Regional, a Santa Casa, o Gpaci e o Samaritano, além do asilo Vila dos Velhinhos. São muitas as histórias que a Dra. Jertrudes gosta de relembrar. Inclusive, como surgiu o nome: “Jertrudes é uma homenagem a uma grande amiga que me acompanhava nas visitas aos hospitais. E também é o nome de uma galinha que eu tive”.

“O nome que eu carrego é muito forte: Cia Anjos da Alegria"

Jô iniciou a vida de voluntária na Pastoral da Criança, em Recife. Entretanto, logo percebeu que gostava mesmo era de trabalhar nos hospitais. Ela havia pedido, inicialmente, para ajudar na recreação. Contudo, foi designada para auxiliar na maternidade. “Mas um dia faltou palhaço”, de acordo com Jô, e foi aí que tudo mudou: o trabalho como palhaça humanizadora estava começando.

Um dia, a Dra. Jertrudes se mudou para Sorocaba e passou a trabalhar no comércio. Mas o estresse da profissão a fez passar seis meses de idas e vindas ao hospital como paciente. Durante esse tempo, decidiu voluntariar-se novamente: conheceu o Gpaci (Grupo de Pesquisa e Assistência ao Câncer Infantil). Lá permanecia, por muitas vezes, desde as 9h até meia-noite exercendo o voluntariado nas mais diversas funções. 

Foi em meio à correria dos eventos que ajudava a promover que a palhaça ressurgiu. Durante uma festa, Jô se caracterizou junto com um grupo de palhaços amadores, o que estimulou uma ideia: “Por que não fundar aqui a Cia. Anjos da Alegria?”. Foi definido que a trupe sorocabana levaria o mesmo nome da companhia de Recife. Dessa forma, foi fundada em 2006 a primeira ONG de palhaços humanizadores de Sorocaba, formada por dez mulheres.

A fundadora da Cia Anjos da Alegria, então, resolveu buscar mais conhecimento sobre a área. Ao realizar um treinamento de palhaços humanizadores, viu a necessidade de se dedicar mais aos hospitais. Foi neste momento, com um número limitado de voluntários, que os palhaços passaram a priorizar o ambiente hospitalar.


Voluntários, mas também humanos

Há uma festa completa quando os voluntários da Cia encontram outros grupos de palhaços humanizadores em eventos, de acordo com Jô. Contudo, nos bastidores, a situação é diferente. Segundo a fundadora dos Anjos da Alegria, existe uma certa rivalidade entre ONGs de palhaços humanizadores em Sorocaba. “Nós fazemos o mesmo trabalho, mas eles não querem aproximação”, lamenta Jô. 

Por outro lado, a pouca interação entre os palhaços da própria Cia fora dos hospitais também é algo que entristece Jertrudes. Muitos trabalham ou estudam, e acabam não tendo tempo, ou mesmo evitam, relações mais próximas. “Acontece a visita no hospital, e depois cada um vai para o seu lado”. 


(Foto: Voluntários em evento especial ao Dia das Crianças na UPH Zona Oeste, 2018)

“Muitos participam da seleção e entram na Cia achando que é uma brincadeira, uma palhaçada”, conta Jô. Ela também relata que outros fazem a inscrição para ser reconhecido nas redes sociais: “Ele quer porque ser voluntário é ‘chique’. Mas não é nada disso”, desabafa. As barreiras vão surgindo e, de acordo com a fundadora, pessoas que entram por razões como essas dificilmente permanecem na Cia. 

Por outro lado, Jô relata que muitos voluntários se afastam por diversos motivos. Contudo, os que são apaixonados pelo voluntariado sempre voltam. “Quem trabalha com amor e comprometimento, fica. Mesmo que se afaste ele nunca esquece. Sempre que ele pode, ele volta”. 

Outro aspecto muito recorrente é o fato de voluntários buscarem a Cia com a intenção de buscar auxílio, por meio do trabalho voluntário, para questões pessoais, como a depressão. Jô, que possui experiência direta com a doença há anos, discorda que o hospital possa solucionar o problema. “A sua depressão, infelizmente, não vai ser curada com as visitas. Porque o ambiente hospitalar tem muitas pessoas doentes, o que pode piorar a situação”, opina.

A orientação é que todo voluntário com mais de um ano de visitas seja acompanhado por um psicólogo. Segundo Jô, as energias adquiridas dentro dos hospitais podem ser tanto boas quanto ruins, por isso é necessário ter o auxílio de um profissional.

Um olhar profissional

A sala da recepção é pequena e todas as cadeiras estão ocupadas por pacientes que assistem a um programa de entretenimento matinal. Gislaine Gargaro, conhecida como Gi, surge de uma das salas do ambulatório psiquiátrico. A mulher de 45 anos carrega um sorriso constante e, antes de cumprimentar os presentes, brinca com uma de suas pacientes, dá-lhe um abraço e beijos no seu rosto e num machucado recente em seu joelho. 

A Cia Anjos da Alegria realiza visitas na enfermaria da ala psiquiátrica do Hospital Regional de Sorocaba há três anos e meio, acompanhados por enfermeiros e pela terapeuta ocupacional Gislaine Gargaro, que trabalha no local desde 1998. 

No hospital, os pacientes deprimidos, psicóticos e bipolares que colocaram em risco a própria vida, a de outra pessoa, ou mesmo o patrimônio onde vivem, recebem acompanhamento psicológico, psiquiátrico e terapêutico, de forma que podem ser mantidos sob observação de 5 a 30 dias. “Eu, junto com os voluntários da Cia, vou à enfermaria para sanar a angústia, a ansiedade e a vontade de ir embora que essas pessoas possuem”, conta Gi.

A Terapia Ocupacional realiza uma função fundamental no tratamento de transtornos mentais. Com atividades práticas, o profissional da área consegue estimular a autoconfiança, autonomia e comunicação nos portadores de distúrbios psíquicos. No Hospital Regional, esse trabalho ocorre em conjunto, promovendo também a experiência de convivência coletiva. 

Os pacientes que são encaminhados para o ambulatório do hospital participam, inclusive, de atividades como marcenaria, artesanato, pintura e dança. “Sabe aquela dancinha?” — Gislaine se levanta e, por meio de movimentos, explica que é possível reconhecer as patologias e como cada uma reage a esse tipo de atividade. “Você vê o sintoma do paciente!”, afirma a terapeuta, entusiasmada. 

Ainda de acordo com a terapeuta ocupacional, por meio da reabilitação com os palhaços humanizadores, os pacientes aos poucos voltam a se expressar. “Às vezes, o paciente é deprimido e isolado, mas consegue falar na presença dos palhaços. O apático, ri. Os que não conseguem levantar da cama, finalmente levantam. Mesmo que só por um momento, mas é importante”, ressalta Gi, que considera significante cada sinal de progresso dos pacientes.

O recurso terapêutico vivo

De acordo com Gi, o palhaço humanizador é um recurso terapêutico vivo, pois traz um complemento especial ao tratamento. Ainda segundo a terapeuta, às vezes os pacientes querem puxar os narizes vermelhos ou mesmo pegar os acessórios dos voluntários. Também é comum que tanto os palhaços quanto os pacientes se apeguem uns aos outros. “Ontem mesmo um paciente se apaixonou pela Keka, dizendo que ela é o Sol dele!”.


(Foto: Viviane Gimenes (Dra. Pirilimpimpim), Gi Gargaro e Érika (Dra. Pitica) celebrando o Setembro Amarelo, 2018)

Erika Sbardelotto, conhecida como Keka ou mesmo Dra Pitica, é uma voluntária da Cia Anjos da Alegria que realiza frequentemente visitas na ala psiquiátrica do hospital. A mineira, mãe e pedagoga recém-formada de 38 anos decidiu fazer a inscrição para entrar na Cia há cinco anos. 

A decisão em ser uma palhaça humanizadora surgiu ao se mudar para Sorocaba, quando ela ficou desempregada e recebeu a sugestão e o incentivo de duas amigas já associadas aos Anjos da Alegria. Após realizar visitas em diversas alas, Keka decidiu se candidatar para realizar visitas semanalmente na psiquiatria, que enfrentava uma carência de voluntários. 

“Todas as visitas comprovam o quão gratificante é realizar o voluntário, e em especial na psiquiatria. Lá eu escuto histórias e casos dos internos que considero lições de vida. Eu vou para distrair os pacientes que estão internados e saio com um grande aprendizado. Isso me conquistou de uma forma inexplicável!", declara Dra. Pitica.  

As diversas memórias de Jertrudes

A doença que trouxe o paciente até o hospital não interessa. O palhaço deve estar atento, na verdade, ao que a pessoa deseja. Jô destaca que, muitas vezes, o paciente quer apenas desabafar, e os palhaços possuem a função de ouvir. Já em outras ocasiões, há pessoas que negam as vistas, mas ela compreende: “Os pacientes possuem esse direito”. 

As visitas não acontecem apenas para quem possui alguma enfermidade, mas também são feitas para os acompanhantes e funcionários. “Eles adoecem no hospital, pois estão lidando com um ambiente de doenças e mortes”, destaca Jô, que faz questão de visitar a UTI focando o olhar nos funcionários.

As lembranças que mais marcaram o trabalho como palhaça humanizadora ocorreram na UTI, de acordo com a fundadora da Cia. Uma delas, envolveu um adulto em estado grave. “Tinha uma pessoa na UTI toda costurada do nariz até a parte do tórax. Aquela costura de saco, sabe? E ele só tinha a boca, só um buraco. Então, nós começamos a tocar violão e cantar algumas músicas para ele. Você acredita que ele acompanhou?”. 

Ela lembra que, mesmo sem voz, o paciente movimentava a boca, cantando três músicas. Todos os funcionários do local reuniram-se, tornando aquele um momento de muita emoção. Três dias depois, o paciente faleceu. “Ele foi para 'outro plano', mas com certeza esse dia foi um momento feliz da vida dele”, recorda Jô, emocionada. 

Outra situação parecida ocorreu na UTI infantil. De acordo com Jô, foi quando, em meio a canções, um menino saiu do coma. “A médica e outras várias pessoas choraram. Os únicos que não podiam chorar ali éramos nós, os palhaços. Porque tínhamos que manter o ritmo, mesmo que com a voz embargada”. Ainda segundo a voluntária, a criança ficou saudável e retornou para casa.

Por outro lado, as visitas também possuem seus momentos engraçados. “Vimos uma senhora e a voluntária falou ‘Olá, como vai a senhora? Em breve, a senhora vai sair. Vai sair ótima! Vai sair correndo!’. Contudo, a paciente havia amputado as duas pernas, o que as palhaças descobriram momentos depois. Dessa forma, Jô afirma que é essencial que o palhaço sempre faça um reconhecimento visual atento ao quarto e ao paciente.

A voluntária de riso fácil e marcante afirma que guarda todas estas e outras vivências com carinho. "São inúmeros os casos que eu guardo na minha memória. Sempre com alegria, porque eu usei a minha humanização, o meu carinho e o meu amor para tirar as pessoas do estado em que se encontravam", declara.

“Da mesma forma que entramos juntas, vencemos juntas”

A paixão por luas, que compartilha com a sua filha, foi determinante para o nome de palhaço que escolheu para ser reconhecida: Lua, um satélite natural dedicado especialmente à pequena Lavínia. Silvana Passos tem 30 anos e atua como voluntária na Cia Anjos da Alegria desde março de 2018. Entretanto, seu interesse em ser um palhaço humanizador vem antes disso. 

A operadora de máquinas conheceu a Cia na empresa onde trabalha, através de um colega que sempre divulgava quando as inscrições eram abertas para participar da ONG. Em uma dessas ocasiões, Silvana se inscreveu, mas devido a problemas pessoais que vivia na época, não pôde realizar o trabalho voluntário. 

Contudo, em novembro de 2017, um acontecimento com sua filha foi decisivo para a vida das duas. Após muitas crises de alergia, que formavam pequenas feridas na pele de Lavínia, a menina acabou adquirindo uma bactéria, que ocasionou sua internação no Hospital Samaritano. “Foram momentos muito difíceis”, conta Lua, emocionada, ao recordar a luta que passaram e a promessa que fez à filha, e cumpriu: a de que superariam aquela situação. 

Nos sete dias em que as duas ficaram no hospital, receberam duas visitas dos voluntários da Cia, da qual Lua relembra detalhadamente. “Os palhaços levaram balões e máscaras da galinha pintadinha. Eles ficaram 15 minutos no quarto, mas que foram suficientes para proporcionar um momento de muita alegria para a Lavínia, que desde o dia em que foi internada, só queria ir embora de qualquer jeito”. 


(Foto: Lavínia brincando com os voluntários da Cia no período em que estava internada )

De acordo com Silvana, o acontecimento foi decisivo para que tivesse, definitivamente, motivação de se tornar uma palhaça humanizadora. "A experiência trouxe alegria até mesmo para mim, que vi minha filha bem e brincando. Então, eu pensei que eu deveria levar essa mesma alegria a outras pessoas", conta Lua, satisfeita com a escolha que fez. 

Desde que é voluntária na Cia, Lua enxerga a vida mais leve, assim como é mais esperançosa sobre as coisas que acontecem ao seu redor e reconhece pequenos gestos. Para ela, ser um palhaço humanizador é isto: levar amor e alegria às outras pessoas, para que possam ver que, apesar das dificuldades vivenciadas no momento, aquilo vai passar, mesmo levando algum tempo. 

Para Lua, as pessoas que conhece ao longo das visitas são essenciais para a construção da sua nova perspectiva. O exemplo mais marcante disso está na primeira vez em que fez trabalho voluntário. A ocasião ocorreu no Grupo de Pesquisa e Assistência ao Câncer Infantil, ou Hospital Gpaci, onde conheceu M.E. 

“Era uma paciente que transmitia uma alegria encantadora, o que proporcionou muito mais felicidade para nós do que deveríamos proporcionar à garota”, ressalta. Durante a visita, Lua também relembra que M.E. ficou brincando com a mãe pelo quarto, muito contente, com espadas de bexiga inflável feitas pelos palhaços, o que comoveu a voluntária. 

Silvana tenta passar os valores que aprende no ambiente hospitalar para a filha, que tem vontade de participar das visitas, e até mesmo já recebeu um nome de palhaça: Pipoca. A voluntária explica que a escolha surgiu pelo jeito agitado da menina, que inclusive adora dizer, com orgulho, que sua mãe é palhaça em hospitais. Enquanto não pode acompanhar a Dra. Lua, Pipoca faz um único pedido especial: que a mãe retorne das visitas ainda caracterizada de palhaço, para que veja e se divirta. 



(Foto: Silvana Passos (Dra. Lua) e a filha Lavínia (Pipoca) caracterizadas de palhaço)


Ser um anjo da alegria também exige aperfeiçoamento

As redes sociais são grandes aliadas dos palhaços humanizadores. É lá que a Cia busca divulgar seu trabalho por meio de fotos, vídeos e textos, bem como atrair possíveis novos voluntários da ONG. No Facebook, a página da Cia Anjos da Alegria já soma mais de 9.000 curtidas. Já no Instagram, a conta tem um pouco mais de 1.200 seguidores. 

O processo seletivo para novos voluntários ocorre duas vezes ao ano, e é sempre divulgado nas redes sociais. O recrutamento é realizado por meio de um questionário feito no Google, em que os participantes respondem perguntas sobre si mesmos e suas respectivas relações com o voluntariado. A idade mínima para participar é de 16 anos.  

Os inscritos com as respostas mais criativas e interessantes são pré-selecionados para fazer um treinamento, que só é realizado após o pagamento de uma taxa. O investimento garante que o voluntário, ao concluir o treinamento, receba um jaleco, camiseta e nariz de palhaço. Isso permite a padronização entre os voluntários, criando uma identidade própria. Além disso, o dinheiro é utilizado para ajudar nas despesas da Cia Anjos da Alegria. 

Os treinamentos são realizados no asilo Vila dos Velhinhos, em um salão disponibilizado pela administração do local mediante a doação de um quilo de alimento não-perecível por cada voluntário. Lá, os mais novos palhaços humanizadores aprendem sobre técnicas, regras dos hospitais, além de realizarem dinâmicas em grupo. Tudo isso garante que os calouros se sintam seguros e preparados no momento de realizar as visitas. 

Além do treinamento, quatro membros da Cia participam todos os anos do Encontro Nacional de Palhaços que Atuam em Hospital, realizado em São Paulo pelo programa Palhaços em Rede. A iniciativa, criada em 2007 pela associação de palhaços Doutores da Alegria, visa estabelecer uma rede de cooperação entre indivíduos e grupos que atuam nos hospitais como palhaços, tendo como foco a qualidade do que é levado para a criança ou adulto hospitalizado.


(Foto: Voluntários da Cia no 5º Encontro Nacional de Palhaços que Atuam em Hospital)

A magia do mês natalino

A atuação da Cia Anjos da Alegria vai muito além dos hospitais. Ao longo do ano, auxiliam em escolas e instituições, além de eventos beneficentes. Em dezembro, próximo ao Natal, os palhaços humanizadores vão ao centro de Sorocaba realizar um dia de abraços grátis.

No último mês do ano, também é comum que Jô vá aos Correios recolher uma das inúmeras cartas deixadas por crianças. Em uma dessas ocasiões, Pitomba estava lendo cada um dos papéis deixados na caixa. Até que encontrou uma carta que atraiu a sua atenção: um senhor de 50 anos, que estava pedindo uma dentadura. 

Jô, por meio de uma amiga, soube que o homem vendia frutas ao lado do 7º Batalhão da Polícia Militar do Interior. "Eu decidi ir lá visitá-lo. Ele tinha um carro Belina, bem velhinho, com uma tábua vendendo bananas e laranjas. Ele não sorriu para mim". O encontro foi decisivo, então, para a fundadora mobilizar os voluntários da Cia na busca de um dentista disposto a fazer o procedimento. Mais de duas idas e vindas ao dentista e o homem, finalmente, pôde sorrir como gostaria. Contudo, Pitomba não presenciou o resultado. 


(Foto: Abraço grátis, 2016)

Até que, um dia, foi abordada na recepção de um condomínio por um homem de cabelos tingidos, uniforme e com uma boa aparência. "Ele disse ‘Posso te dar um abraço?’, e eu respondi que não sabia o porquê, mas que podia". Então, Jô foi surpreendida: "Eu sou aquela pessoa que você ajudou a colocar a dentadura!", afirmou o porteiro. 

De acordo com a fundadora da Cia, o homem explicou que pôde recuperar sua profissão graças à ajuda de Pitomba. Contudo, Jô insiste na possibilidade de que a realização do sonho só foi possível devido o empenho de todos os voluntários da Cia Anjos da Alegria. 


A esperança

A gratidão de Jô pelas conquistas ao longo dos 12 anos é perceptível. “Eu não sei qual é o lado melhor do trabalho como palhaço humanizador, eu gosto mesmo é de tudo! Porque o amor, ele é tão transformador, que você se doa, não pede nada em troca, só agradece", declara. 

Hoje, com a agenda menor e mobilidade mais reduzida, Jô enxerga a vida de forma mais leve. “Já cheguei ao ponto de passar uma semana apenas com 10 reais na carteira, sem almoçar e trabalhando para a Cia. Mas, de repente, as coisas dão uma clareada, sabe? Então, eu não tenho do que reclamar da vida. Eu só reclamo do joelho porque me impede de andar. Mas do resto, minha filha, é tudo de bom".


(Foto: Jô durante entrevista no hospital Santa Casa)

Assim, a fundadora da Cia se levanta de uma das cadeiras na sala administrativa da Santa Casa. Agradece a entrevista, se despede e segue para a reunião com a nova coordenação do hospital: é momento de requisitar estacionamento gratuito aos voluntários que realizam visitas no local. 



*Reportagem produzida em 2018 para a disciplina Agência Experimental, realizada em conjunto pelos estudantes de jornalismo Ana Flávia Costa, Anna Julia Savioli, Carol Fernandes, Gabriel Lara, Giulia Camargo, Isabeli Arrais e João Victor Scudeler



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